Privatização da TAP (2) – O Sucesso da TAP no Futuro


Depois do anticlímax que culmina com a conclusão do processo de privatização da empresa, a 20 de Dezembro de 2012, o que agora está em causa é o Sucesso da TAP no Futuro.

Este é o tema ponto da nossa análise, (1) feita em termos crus e apoiada por uma síntese da situação actual da empresa [ver o Ponto 1 do Documento de Trabalho].

Depois, analisamos o processo de privatização da TAP (2), entre o Memorando de Entendimento, de Maio de 2011, e a decisão do Conselho de Ministros de 20 de Dezembro de 2012.

Esta decisão, mais do que o concluir um processo, é o ponto de partida para o Sucesso da TAP no Futuro.

 

A análise do presente post deve ser integrada no contexto mais vasto do post de 21 de Setembro de 2012:

-“Privatização da TAP Air Portugal (1) - De Salazar à Actualidade”


O Documento de Trabalho, com as notas e textos que sustentam as afirmações do post, pode ser consultado em:

 https://docs.google.com/file/d/0B9yEd1P9CtlCcjN2MU5RUC1lVUE/edit


 
Índice

1.O Sucesso da TAP no Futuro

1.1.Factores Condicionantes do Sucesso da TAP no Futuro

1.2.Actores do Sucesso da TAP no Futuro

2.À Politica o Que é da Politica

3.Processo Formal de Privatização da TAP

3.1.Decreto-Lei de Agosto/Setembro de 2012

3.2.Caderno de Encargos: 19 de Outubro de 2012

3.3.Admissão do Potencial Investidor e Decisão do Conselho de Ministros

Notas

 

1.O Sucesso da TAP no Futuro

1.1.Factores Condicionantes do Sucesso da TAP no Futuro

*Sustentabilidade do Hub de Lisboa

Ignoramos a verdadeira dimensão das vantagens comparativas da localização geográfica do aeroporto de Lisboa para o hub da TAP captar tráfego entre Europa, América do Sul e África. Na concorrência com outros aeroportos, algumas vantagens deve ter.

Mesmo que as tenha, a sustentabilidade do hub depende de vantagens competitivas, que se medem

-pela procura endógena, formada a partir de viagens de residentes nos países mais importantes (Portugal, Brasil, Angola e Moçambique), procura reforçada pela actual prosperidade de Brasil e Angola e pelo potencial de Moçambique, que gera turismo (3), e o empobrecimento de Portugal, que gera a emigração, a qual gera mais turismo,

-pela procura exógena, formada a partir da capacidade da TAP captar tráfego entre Europa e América do Sul e África, que “passa por Lisboa” como poderia passar pelo hub de Madrid ou viajar ponto a ponto – a maior pressão da concorrência ao hub de Lisboa reside nesta procura, que dispõe de mais liberdade de escolha.

As vantagens competitivas do hub resultam de duas dinâmicas:

-a de Portugal, com destaque para Lisboa, passar a ser competitivo na atracção de empresas e negócios, que aumentem a procura endógena – é aqui que se situa o projecto, de “Portugal/Lisboa, plataforma intercontinental”, como realidade concreta e não apenas fantasia politica, 

-a da TAP ser competitiva, o que exige um novo accionista, como demonstramos a seguir (4).

Criar estas vantagens competitivas é condição necessária para a sustentabilidade do hub de Lisboa. Não é condição suficiente porque, num mercado com muita concorrência, nenhuma procura é um “direito garantido”.

*Sem o Hub de Lisboa, a TAP Não é Viável

A sustentabilidade do hub de Lisboa condiciona o Sucesso da TAP no Futuro. Com efeito, sem o hub, a TAP não é viável e está condenada à insolvência, porque

-fica reduzida ao tráfego de, e para Portugal, na sua maioria intra-europeu, mais algumas rotas de longo curso, com poucas frequências – é um regresso à TAP de “antes da Estratégia de 2001”, mas em mercado muito mais competitivo por via das mais diversas companhias low cost,

-o indispensável downsizing da sua estrutura é legalmente difícil e politicamente quase impossível, o que conduz a TAP à insolvência, cuja burocracia a mata, na ausência um Chapter Eleven português.

Só o hub garante o volume de tráfego de longo curso, que pode rentabilizar a TAP e justificar a rede intra-europeia. Em qualquer dos casos, esta rede terá de passar por reconversão similar às que estão a ter lugar em algumas congéneres de referência.

*Financiamento a Assegurar Pelo Accionista Privado

O Sucesso da TAP no Futuro e a experiência do falhado processo de privatização mostram que Governo e Comprador têm de ser rigorosos sobre a Proposta Financeira. Entre outros casos, lembramos

-o novo accionista substituir-se ao “accionista Estado”, na garantia à dívida de cerca de € 1.2 mil milhões,

-a recapitalização da TAP, SGPS, SA, em função do valor acumulado no fim do Exercício de 2012 e das necessidades do funcionamento da empresa,

-o financiamento da renovação da frota, que garanta a competitividade e o crescimento da TAP,

-o encaixe líquido da venda não é o argumento da decisão de vender, nem critério fundamental na escolha do comprador.

O rigor da proposta financeira do novo accionista não é tudo, mas sem ela, a TAP pública está condenada, a prazo.

*Valor da Marca TAP Portugal

Se o hub de Lisboa e a TAP forem sustentáveis e o financiamento garantido pelo novo accionista, manter a Marca TAP Portugal faz sentido e é parte da lógica do negócio. Não dispomos de informação sobre o valor da Marca TAP Portugal, mas

-há manifestações claras de uma Imagem de Marca favorável em segmentos importantes da procura endógena,

-no caso da procura exógena, deve haver uma graduação, desde a mera Market Awareness à Imagem de Marca positiva.

A garantia de continuidade da Marca TAP Portugal reside na sua capacidade de criar valor para a empresa, por via de vendas mais fáceis e rentáveis – mais uma vez, a continuidade depende de nós.

O tempo contratual que possa proteger a Marca é sempre efémero, porque

-se não houver criação de valor, a Marca desaparece – quem se lembra da Pan American?,

-apesar do valor que a Marca possa criar, há sempre o perigo de ser eliminada pelo ego de accionista entrepreneurial, ou pela consistency da política de grande companhia, mesmo se for um erro.

Na maior parte dos casos, o discurso politico e romântico sobre manter a Marca TAP Portugal ignora a nudez crua desta realidade do mercado (5).

*A Privatização da TAP é Indispensável e Boa Para o País

Desde 2001, a TAP é uma «empresa pública» diferente, porque

-o seu maior ponto fraco não é a “Gestão Pública”, mas sim o “accionista Estado”,

-o que está em causa não é a mezinha tradicional de “substituir o gestor público”, mas a receita inovadora de encontrar o novo accionista privado, que assegure a sua sustentabilidade.

Não podemos ignorar que o “accionista Estado”

-apoia mais de vinte e cinco anos da TAP constantemente deficitária “transportadora aérea nacional”, para a qual nomeia gestores de génese politica e/ou partidária,

-quando garante o saneamento financeiro de 1994 (injecção de capital de 180 milhões de contos e garantias a empréstimos até 169 milhões), cedo vê os esforços gorados: em 1999 e 2000, o Resultado Líquido da TAP é negativo em 20 e 25 milhões de contos, pondo a empresa de volta ao caminho para a falência,

-é inconsistente no apoio à Gestão Profissional que lidera a TAP a partir de 2001, por não haver policie consensualizada que lhe permita fazer melhor – a nomeação do Presidente Cardoso e Cunha, em 2003, é ícone desta inconsistência, 

-não pode desempenhar as funções de accionista, pela falta de capacidade financeira e de decisão politica, mais as regras da União Europeia – a actual descapitalização da empresa é o ícone desta incapacidade.

Esta realidade exige uma transformação profunda que evite a insolvência e encerramento da TAP. Pode ser a privatização a 100% ou outra, que desconhecemos.

Defendemos a privatização da TAP, mesmo a 100%, por razões que têm a ver com esta incapacidade do “accionista Estado” e com a capacidade que exigimos ao novo accionista:

-conhecer o Transporte Aéreo,

-recapitalizar a empresa e financiar o seu funcionamento,

-apoiar a sua competitividade e crescimento por renovar e expandir a frota,

-ser capaz de capaz de fomentar uma renovada e profícua relação com os gestores e os trabalhadores.

Esta é a via para dar sustentabilidade à TAP, ao hub e à Marca. A sustentabilidade da contribuição da TAP para a Economia resulta da privatização e é comprometida pelo continuar na “TAP pública”.  

*Uma Discordância com o CEO da TAP

Entre muitas, lembramos duas declarações de Fernando Pinto (6):

-no início de Outubro, interrogado sobre “Mas manter-se a TAP como empresa pública não faria sentido. É isso?”, Fernando Pinto responde “Saber se a TAP sobrevive assim, claro que sim. Mas não é a situação ideal. O ideal é mesmo que receba capital para poder ter uma vida normal.” [o sublinhado é nosso].

-em 21 de Dezembro, afirma que “privatização da TAP é uma oportunidade, mas não uma necessidade”, acrescenta que “a privatização é uma oportunidade importante para [a empresa] ter acesso a capital, maior velocidade de crescimento e para se posicionar ainda melhor no mercado” e volta a sublinhar que a venda “não é uma necessidade de sobrevivência [o sublinhado é nosso].

Salvo o devido respeito, que até é mesmo muito, Fernando Pinto não diz quanto tempo sobreviveria esta TAP, sem ser privatizada.

A nossa discordância com o «a TAP poder sobreviver», mantendo o “accionista Estado”, resulta da incapacidade intrínseca deste e da relação medíocre que estabelece com a Gestão Profissional e, por via dela, com os Trabalhadores. O accionista de que a TAP necessita não pode deixar

-descapitalizar a empresa ao ponto em que está, deve é ter a força para exigir que a Gestão remunere o capital investido – esta pode ser a afirmação que nunca vimos ser feita por nenhum dos “accionistas” de passagem,

-envelhecer a frota e não a expandir, dificultando a sua eficiência e a qualidade de serviço que captam passageiros,

-arrastar a reconversão de estatutos do pessoal (de que a Grounforce é exemplo icónico) e limitar-se a tentar impor cortes cegos na massa salarial.

Esta estranha relação entre accionista incapaz e Gestão Profissional não está em condições de assegurar a sustentabilidade da TAP. Ignoramos durante quanto tempo pode a TAP “sobreviver”, mas sabemos que é pouco e desejamos algo de muito melhor para Portugal. Os «defensores da TAP pública» não têm o exclusivo da defesa dos interesses do País.

*Lidar Com Pontos Fracos

No futuro próximo somos obrigados a lidar com três pontos fracos, que já influenciam negativamente o processo de privatização que termina a 20 de Dezembro.

-continuamos a não ter, para a Aviação Civil em Portugal, uma política, de policie e não de politics (7), na qual a TAP se integre [ver a seguir],

-não parece possível que Governo e PS construam um consenso sobre a privatização da TAP e corremos o risco do Governo não corrigir erros que cometeu no processo anterior,

-a Opinião Pública contra a privatização da TAP não se vai alterar significativamente. Mesmo que o Governo assegure uma informação e comunicação de elevado nível, boa parte da Opinião Pública não a terá em conta. Mesmo que a comunicação social seja mais objectiva, um outro caso do género Relvas/Dirceu é suficiente para criar um clima de suspeição sobre quem vende e quem compra.

*Rever Equívocos Sobre a TAP

Desde as decisões comunitárias que abrem a concorrência no Espaço Aéreo da Comunidade Europeia e proíbem ajudas do Estado à TAP (1994), e a Nova Estratégia da Gestão Profissional (2001), a TAP deixa de ser a Transportadora Aérea Nacional, com a possibilidade de manter rotas e frequências estruturalmente deficitárias.

No caso da Diáspora Portuguesa (8),

-a TAP não voa para países com importantes “comunidades portuguesas” (Canadá e África do Sul),

-na Europa, as rotas das companhias low cost servem melhor as “comunidades portuguesas”, por serem mais variadas e competitivas, e a TAP dar a prioridade a passageiros que utilizem o hub do qual a sua sustentabilidade depende.

Na Acessibilidade Aérea, a percentagem de Passageiros que Desembarcam em aeroportos do Continente e viajam em companhias estrangeiras é

-em 2011, 58% do Total, 96% em Faro, 70% no Porto e 38% em Lisboa,

-em 2001, 54% do Total, 91% em Faro, 43% no Porto e 52% em Lisboa.

Entre 2001 e 2011: a percentagem do Total e em Faro aumenta, a do Porto aumenta e a de Lisboa diminui significativamente. A evolução de Lisboa é explicada pelo hub da TAP e no Porto pelas companhias low cost.

Estes números incluem, também, passageiros residentes em Portugal, na sua viagem de regresso e os não residentes que visitam Portugal ou utilizam o hub só em trânsito. Se considerarmos apenas os não residentes (os tais que geram procura para bens e serviços transaccionáveis), a parte das Companhias Estrangeiras será maior (9).

Compete ao Estado fazer com que a acessibilidade aérea a Portugal seja competitiva. Em nossa avaliação,

-a acessibilidade aérea depende cada vez mais de companhias aéreas estrangeiras,

-uma TAP privada serve melhor esta função do Estado, do que a TAP pública serviu desde 1975 e mesmo do que a da Gestão Profissional, desde 2001.

A contribuição da TAP para a Economia (Balança de Pagamentos, Produto, e Emprego) depende da sustentabilidade do Sucesso da TAP no Futuro e esta TAP será privada.

*Declarações do Primeiro-Ministro a 21 de Dezembro de 2102

A 21 de Dezembro, um dia depois do anticlímax do encerrar da privatização da TAP, o Primeiro-Ministro reconhece:

-“A TAP tem um passivo superior a 1500 milhões de euros, precisa de renovar a frota para permitir ganhos operacionais superiores a 20% na poupança de combustível, mas também para ter novas rotas, para acrescentar valor à operação da TAP. Nada disto o Governo está em condições de fazer”.

-“Não podemos disfarçar as dificuldades em que a TAP vive e a necessidade que temos em termos de gestão para poder controlar os custos da TAP, e limitar os estragos para a divida da TAP que a actual situação comporta”.

Por fim, o Primeiro-Ministro deixa uma garantia:

-“Assim que for oportuno colocaremos de novo a privatização da TAP em cima da mesa”.” (10).

O Sucesso da TAP no Futuro começa aqui.

1.2.Actores do Sucesso da TAP no Futuro

*O Accionista Privado

É errado deixar arrastar a situação actual, em que temos:

-Governo enfraquecido, gestores “pendurados”, concorrência a aumentar, frota a envelhecer, problemas financeiros que se agravam, quase impossibilidade da União Europeia aceitar uma “ajuda extraordinária do Estado” e de o Estado a poder conceder.

Quanto mais deixarmos degradar a TAP, mais difícil será a sua privatização. O processo de privatização encerrado em Dezembro de 2012 mostra que

-a procura pela aquisição da TAP se reduz a um único comprador,

-a Proposta Estratégica é excelente, mas a Financeira é recusada.  

A procura do Accionista Privado deve ser intensa e realista, porque compradores para a TAP não abundam e a Proposta Financeira não é fácil. Não podemos repetir a Grande Ilusão [ver a seguir].

*Gestores

Sem pôr em causa o melhor que, desde a nacionalização de 1975, cada um dos gestores faz ao longo de mais de vinte e cinco anos, a TAP só tem uma verdadeira Gestão Profissional desde 2001.

Entre a actualidade e a privatização, que não deve demorar, o Governo

-deve manter e motivar a actual equipa liderada por Fernando Pinto, pela sua experiência e por o “accionista Estado” muito dificilmente a poder substituir em prazo útil e sob a incerteza da decisão do novo accionista,

-tem de matar à nascença qualquer ideia de gestores de génese politica e partidária – o cenário de 2003, com Cardoso e Cunha, não se pode repetir.

Em 21 de Dezembro de 2012, Fernando Pinto declara:

-a permanência na TAP “Depende da vontade do governo, da minha e da equipa que está aqui” e “Depende de como se vai conversar, esta é uma nova fase da empresa”,

-“se for vontade das duas partes ficamos” (11).

Dito isto, é novo accionista quem escolhe dos Gestores da TAP privada.

*Trabalhadores

Imaginamos que um número crescente dos Trabalhadores da TAP está consciente que a fatal insolvência da empresa deixou de ser uma impossibilidade politica e passou a ser uma possibilidade do mercado.

Neste cenário, os Trabalhadores são parte da construção de uma solução de futuro, apesar de haver sempre a minoria irredutível na oposição à privatização. O patético caso de 20% do capital para os pilotos, ícone supremo do irrealismo, é o passado, deixou de ser parte do problema e nunca foi parte da solução.

Um accionista exigente, como é Efromovitch, reconhece que a TAP está “enxutinha”. Tal parece excluir uma privatização com decisões dramáticas a nível laboral, mas a reconversão nas rotas intra-europeias vai ser dura.

*”Avec le temps ... Avec le temps va, tout s’en va”

O tempo tudo resolve, mas o resultado pode ser péssimo. Na ocorrência, o tempo joga a contra a privatização da TAP, porque favorece a inercia do que há de negativo na politics, na opinião pública e nos interesses que sentem a sua zona de conforto ameaçada.

Quando o tempo joga a favor do nosso insucesso, a liderança é urgente. Viabilizar a TAP passa por privatização bem conduzida e melhor decidida.

 

2.À Politica o Que é da Politica

*Insucesso de uma Privatização Não Prestigiante Para o País

A TAP não é vendida porque apenas é reconhecido um comprador potencial e este não presta as “garantias adequadas” (12).

Com a não venda da TAP, há quatro perdedores e há uma perda que é comum a todos nós:

-a privatização da TAP falha de maneira não prestigiante para o País.

Registamos que as notícias do Diário de Noticias e Publico sobre contactos entre Governo e Comprador, enquanto decorre a reunião do Conselho de Ministros de 20 de Dezembro, são desmentidas pelo Primeiro-Ministro, na Assembleia da República. A terem ocorrido o desprestígio atingiria o nível de escândalo (13).

Depois, o primeiro e mais importante perdedor é a TAP. O regozijo dos que se opõem à sua venda ou a esta venda esquece que, a partir de agora,  

-é uma TAP ainda mais enfraquecida que vai ser confrontada com a dura realidade do mercado,

-agrava-se o que, desde a nacionalização de 1975, tem sido uma das maiores fraquezas da TAP: a incapacidade do ”accionista Estado” desempenhar o seu papel, de que a incapacidade do “gestor Estado”, de antes da Gestão Profissional de 2001, é apenas um aspecto.

Depois desta perda para o País e para a TAP,

-o Governo perde, por não atingir um objectivo, pela responsabilidade no processo de privatização não prestigiante e pelo prejuízo causado ao País.

-Fernando Pinto, o rosto da Gestão Profissional, perde quando o mercado nega a sua avaliação sobre o interesse na TAP e valor desta e da estratégia da Manutenção do Brasil.

Em outro plano e num crescendo com o seu anticlímax a 20/21 de Dezembro, perde o excessivo número de comentadores que opinam sobre um dossier que desconhecem e uma actividade económica que ignoram.

*Sobre “o Perder de Fernando Pinto”

A nossa posição sobre “o Perder de Fernando Pinto” nada tem a ver com o que parece ser a condenação da Gestão Profissional da TAP por “mais um politicamente correcto” do Portugal mediatizado de hoje. O reconhecimento do valor e a defesa da Gestão Profissional da TAP mantêm-se intactos, mas não impedem duas posições críticas:

-Fernando Pinto avalia mal o valor que o mercado do Após Crise de 2008/2009 atribui à TAP: há apenas um candidato a comprar e pouco mais paga do que se substituir ao “accionista Estado” na capitalização da empresa e na garantia da dívida. No próximo futuro, é pouco provável que o interesse pela TAP aumente significativamente. A explicação deste fraco interesse é, em grande parte, exógena, mas é o que é – a TAP pode valer mais, mas o Mercado não reconhece esse valor.

Sobre a polémica Manutenção no Brasil, a 14 de Abril de 2012, em entrevista a O Dinheiro Vivo, Fernando Pinto insiste: “foi e é um bom negócio”. O jornalista escreve: “As oficinas da TAP: o último desafio de Fernando Pinto”. Em nossa opinião e até agora, os números mostram que está longe de ser um bom negócio.

Na privatização da TAP, Fernando Pinto perde. Esta perda não invalida o valor do seu trabalho e o interesse em que continue a liderar a Gestão Profissional da TAP.

*Maio de 2011: Memorando de Entendimento

O Memorando de Entendimento, assinado em Maio de 2011 pelo Governo de José Sócrates e, posteriormente, pelo PSD e CDS

-menciona o “privatization programme” do Governo [de José Sócrates],

-fixa a data limite da privatização da TAP “by the end of 2011”.

Sem o acordo entre Portugal e a EU/BCE/FMI, a privatização da TAP nunca teria chegado à agenda do Conselho de Ministros, por a dinâmica endógena da política portuguesa ser incapaz de vencer as resistências internas que a têm impedido. Reconhecido este contributo, o acordo

-fixa um prazo absurdo e impossível de cumprir – não se privatiza num semestre uma companhia aérea como a TAP.

As disposições pertinentes do Memorando de Entendimento e do Programa do Governo são descritas no Ponto 4 do Documento de Trabalho.

*Junho de 2011: Programa de Governo

Em Junho de 2011, o Programa do Governo

-menciona a “frágil estrutura financeira”, a “escala reduzida no contexto europeu” e propõe a “definição de um projecto de crescimento a longo prazo para a companhia aérea”,

-prevê que o modelo de privatização da TAP inclua a manutenção da imagem de “companhia-bandeira” e das principais operações baseadas no aeroporto de Lisboa, mais o serviço de transporte aéreo para as ilhas.

O Programa prevê, ainda, que “No que diz respeito à TAP e à ANA, serão definidos de forma articulada os respectivos modelos de privatização”.

*Que Politica (policie) Para a Privatização da TAP?

A exemplo do que acontece com a maioria dos problemas do País, não há, para a Aviação Civil em Portugal, uma política (de policie e não de politics) na qual a TAP se integre.

Esta policie exige concertação entre os partidos políticos do arco do Governo. No caso da privatização da TAP tal deveria ser possível, porque é o Governo PS que a negoceia com UE/BCE/FMI e o Governo da Coligação PSD/CDS que a implementa. Fazer da ausência de policie uma arma de arremesso contra o Governo (ou contra o PS, na oposição) apenas aumenta a entropia do sistema e só atrasa a consensualização de que o País carece.

O ícone mais recente desta ausência de policie é dado pelo Ministro de Estado e das Finanças ao incluir a privatização da ANA no calendário de muito curto prazo do deficit e, por via disso, acelerar a da TAP. A decisão do Ministro confirma a nossa ideia de, no Sistema Politico, Administrativo e Empresarial da Aviação Civil em Portugal, a intervenção do Ministério das Finanças

-lidar apenas com os lucros da ANA e os prejuízos da TAP,

-afastar o Ministério dos Transportes e ignorar o da Economia.

*Lei-Quadro das Privatizações

O Ponto 4 do Documento de Trabalho descreve a maneira como o Governo lida mal com duas disposições pertinentes da Lei-Quadro das Privatizações.

No caso da Comissão Especial de acompanhamento de cada privatização, há três factos que não deviam ter ocorrido e um deles é grave:

-a Comissão não é criada pelo Decreto-Lei, que aprova a privatização da TAP, em Setembro, mas sim pelo Caderno de Encargos, em Outubro – devia ter sido criada pelo Decreto-Lei,

-a Comissão Especial é constituída por Despacho de 11 de Dezembro, publicado a 17 – devia ter sido constituída e os seus membros nomeados ainda em Setembro,

-a Comissão dá parecer sobre um dossier complexo para apoiar uma decisão do Conselho de Ministros tomada entre 9 e 3 dias depois – este prazo é inaceitável e o facto é grave por não respeitar o espírito da Lei.

No caso da disposição legal sobre a “Salvaguarda dos interesses estratégicos nacionais”, o Governo ignora o assunto, apesar

-da disposição legal datar de 11 de Dezembro de 2011, isto é, ter sido aprovada pela Coligação que suporta o Governo,

-da constante insistência do Partido Socialista sobre o seu respeito,

-de respeitar a Lei seja o mínimo a exigir a um Governo.

Nos dois casos, o Governo reforça a desconfiança em relação à privatização da TAP e a medíocre querela partidária, de que o País é vítima.

*Sobre a Intervenção do Tribunal de Contas

O Ponto 5 do Documento de Trabalho analisa a maneira como o Governo lida mal com a intervenção do Tribunal de Contas.

Não deve ser por acaso que, a 3 de Agosto (um dia depois da Aprovação do Decreto-Lei que aprova a privatização da TAP), o Presidente do Tribunal se pronuncia sobre o processo formal que então tem início:

-"A qualidade das finanças públicas e a salvaguarda da soberania têm de estar aliás intimamente ligadas, portanto, quer o Tribunal de Contas, quer o conselho de Prevenção da Corrupção, neste caso reafirmam a necessidade de haver um escrupuloso cumprimento da legislação em vigor e uma ponderação do interesse público que está em causa" (14).

Ainda que com algum atraso, o Governo parece escutar esta observação, pois o preâmbulo do Caderno de Encargos, de 19 de Outubro assume um compromisso:

-“colocar à disposição do Tribunal de Contas todos os elementos informativos respeitantes aos procedimentos adoptados no âmbito do processo de venda directa.”.

No Parlamento, no mesmo dia e em nome do Governo, o Secretário de Estado Sérgio Monteiro garante que o Tribunal de Contas vai fiscalizar o processo desde o início e não apenas no final da operação (15).

Passam dois meses e, a 18 de Dezembro (dois dias antes da decisão do Conselho de Ministros), o Presidente do Tribunal de Contas afirma que o Tribunal não teve qualquer intervenção nos processos de privatização da TAP e da ANA "até à presente data", realçando que "os prazos legalmente previstos não estão esgotados" e que "os prazos legalmente previstos [para o envio de informações sobre os processos] não estão esgotados" (16).

A 28 de Dezembro, a Resolução do Conselho de Ministros que formaliza a decisão da reunião do dia 20, estipula que

-todos os elementos informativos do processo de privatização da TAP sejam colocados à disposição do Tribunal de Contas, e arquivados por um período de cinco anos (17).

Há um equívoco a esclarecer, pois a dupla garantia de 19 de Outubro

-vai para além das disposições legais e mostra a vontade do Governo em assegurar “a absoluta transparência do processo de reprivatização”,

-as declarações do Presidente do Tribunal de Contas e a Resolução de 28 de Dezembro mostram como a declaração do Governo no Parlamento não é respeitada.

Neste contexto, há uma inaceitável falta de respeito pelo Parlamento, onde a garantia é dada, e pelo Tribunal de Contas, que é menorizado. Mais, não faz sentido que o Presidente do Tribunal lembre os prazos legais, pois não são estes que estão em causa, mas sim um compromisso do Governo.

*Atrasos, Pressa e Aceleração do Processo de Privatização

Esquecido o absurdo do prazo de 31 de Dezembro de 2011, fixado no Memorando de Entendimento, temos três ritmos no processo de privatização da TAP [ver Ponto 7 do Documento de Trabalho]. O primeiro é o do atraso na Publicação do Decreto-Lei (21 de Setembro) a aprovar a privatização da TAP e do Caderno de Encargos (19 de Outubro).

O segundo ritmo é o da Pressa, aparentemente influenciado pelo atraso na Publicação do decreto-lei e o prazo de 31 de Dezembro de 2012, para fechar o negócio. A pressa leva

-a que, durante Julho e Agosto, sem o Decreto-Lei Aprovado e/ou Promulgado, o Governo promova a venda da TAP [ver, a seguir, o item sobre “Respeito da Formalidade e Aprovação/Promulgação do Decreto-Lei”],

-ao ícone que é a aprovação simultânea do Caderno de Encargos e do convite à única Proposta vinculativa de aquisição e subscrição que é apresentada.

O terceiro e o mais criticável ritmo é o da Aceleração da Pressa, fruto da conjugação de duas decisões:

-integrar parte do encaixe com a privatização da ANA na redução do deficit das Contas Públicas de 2012,

-manter a lógica de privatizar a TAP antes da ANA, o que obriga mesmo a uma decisão até 20/21 de Dezembro, o mais tardar.

Deve haver determinação na privatização da TAP, mas este fixar de prazos é incompatível com a ponderação que as decisões exigem.

*A Opinião Pública e a Grande Ilusão

A componente política do processo de privatização da TAP não pode ignorar a influência da Opinião Pública e o que designamos de A Grande Ilusão e o seu Esvaziar [ver o Ponto 8 do Documento de Trabalho].

Na ausência de uma policie consensualizada, a privatização da TAP cai na politics nacional e passa a ser excessivamente sensível a manifestações da Opinião Publica. Não é o momento de analisar a Opinião Pública, mas podemos distinguir três dos seus elementos:

-a visão romântica de uma Transportadora Aérea Nacional que já não existe,

-o impacte de um incidente do tipo Relvas/Dirceu,

-a atenção dada ao abaixo-assinado de economistas e professores de Economia.

A Grande Ilusão e o Seu Esvaziar marca o processo de privatização da TAP em dois tempos:

-o do alimentar a Grande Ilusão sobre o grande número e o prestigio de companhias interessadas na compra,

-o do Seu Esvaziar, quando se sabe haver apenas um comprador potencial e este ser o de uma companhia pouco conhecida em Portugal.

Em 11 de Dezembro de 2012, o Publico sintetiza:

-“Desde o início deste ano foram surgindo rumores em catadupa sobre eventuais interessados. Falou-se na Qatar Airways, no grupo IAG (que junta a British Airways e a Iberia), na Lutfhansa, nas brasileiras TAM (que se fundiu com a chilena TAM) e Gol e até na portuguesa Euroatlantic. Mas, quando chegou o dia de apresentar ofertas preliminares de compra, a 14 de Setembro, apenas um investidor avançou.” (18).

Podíamos acrescentar a Emirates, a Turkish Airlines e ainda outras companhias.

A mais recente, mas ténue, manifestação da Grande Ilusão é a convicção de, no próximo processo de privatização, haver mais candidatos e o corolário de que não os houve neste, por o Governo ter optado pela Venda Directa.

 

3.Processo Formal de Privatização da TAP

3.1.Decreto-Lei de Agosto/Setembro de 2012

*Prazos do Processo Formal da Privatização da TAP

O processo formal da Privatização da TAP passa pelos seguintes passos:

-o Decreto-Lei, Aprovado a 2 de Outubro, Promulgado a 20 de Setembro e Publicado a 21 (19), permite ao Governo recolher “intenções de subscrição ou de aquisição” e, aplicando os Critérios definidos, seleccionar as que passam às fases seguintes,

-o Caderno de Encargos publicado a 19 de Outubro permite aos promotores das “intenções de subscrição ou de aquisição”, uma vez seleccionadas pelo Governo, elaborar Propostas vinculativas de aquisição e subscrição,

-as Propostas devem ser entregues até 7 de Dezembro [prazo fixado por Despacho] e, após diligências informativas, são objecto de Parecer pela PARPUPBLICA e pela Comissão Especial,

-sob Parecer da PARPUBLICA e da Comissão especial, o Conselho de Ministros de 20 de Dezembro decide qual a proposta vencedora – prazo fixado de modo a que a decisão sobre a TAP anteceda a da privatização da ANA, a ter lugar antes do fim do ano, em função do deficit das Contas Públicas de 2012.

*Respeito da Formalidade na Aprovação/Promulgação do Decreto-Lei

O Decreto-Lei que aprova a privatização da TAP conhece uma dupla demora [ver o Ponto 9.1 do Documento de Trabalho]:

-Aprovação tardia pelo Governo, em 2 de Agosto de 2012,

-demora de cerca de mês e meio para Promulgação pelo Presidente da República, a 18 de Setembro e Publicação a 21.

A ausência do decreto-Lei a aprovar a venda da TAP não impede o Governo de a promover distribuindo um Memorando of Information sobre a empresa e organizando road-shows em vários países.

Esta sobreposição de tempos não nos parece ser a melhor maneira de

-conduzir o processo no País, por não haver um decreto-lei Aprovado pelo Governo ou, havendo-o, este não ser ainda Promulgado pelo Presidente da República – os tempos de intervenção das Instituições, em particular do Presidente da Republica, devem ser respeitados,

-reforçar a venda da TAP no mercado restrito e muito bem informado em que pode ser vendida e que conhece a ausência de disposição legal às propostas iniciais que recebe do Governo. 

*Opções de Base do Decreto-Lei

-Estrutura e Clareza do Texto

Decreto-Lei e Caderno de Encargos partilham uma característica comum: um texto mal estruturado e de redacção complicada, pouco clara, omissa em aspectos fundamentais e susceptível de gerar equívocos.

Sabemos que o mesmo pode ser dito sobre muitos dos diplomas publicados no Diário da Republica, mas o próximo processo de privatização da TAP exige textos oficiais de melhor qualidade.

-Reprivatizar a TAP, SA, Por Via da Privatização da TAP, SGPS, SA,

O Governo opta por privatizar a TAP, SGPS, SA, “numa estratégia integrada de alienação, que se considera especialmente adequada a potenciar a maximização do valor da TAP.”

O Governo assim entende e não contestamos a opção. Parece residir aqui a opção pela “reprivatização indirecta da TAP, SA”, por via da privatização da TAP, SGPS, SA [ver o Ponto 2 do Documento de Trabalho].

-Lei-Quadro das Privatizações

O processo é lançado ao abrigo da Lei-Quadro das Privatizações, mas acaba por não respeitar devidamente duas disposições fundamentais: Comissão especial e Salvaguarda dos interesses estratégicos nacionais [vero ponto 1 do post e o Ponto 4 do Documento de Trabalho].

-Venda Directa

A opção pela Venda Directa é, entre outros, justificada por respeitar o prazo do Programa de Assistência Económica e Financeira, ser a mais adequada para escolher os investidores de referência e optimizar os proveitos associados à operação.

A justificação desta opção são, de facto, decisões estratégicas relevantes, que analisamos no Ponto 9.2 do Documento de Trabalho.

*Recolha Preliminar de Intenções e Critérios de Selecção

O processo de privatização começa por

-“uma recolha preliminar de intenções de aquisição ou subscrição junto de potenciais investidores”,

-selecção dos interessados que passam à fase seguinte [ver Ponto 9.2 do Documento de Trabalho].

Comentário – Há três observações:

-o texto do decreto-lei não explicita claramente os dois grandes critérios de selecção: o Estratégico e o Financeiro,

-um dos critérios de selecção surge reescrito no Caderno de Encargos e é exemplo de falta de clareza do texto [ver pontos 9.2 e 10.3 do Documento de Trabalho].

*Disposições Diversas

Há disposições com interesse especial:

-as condições finais e concretas das operações a realizar no âmbito da privatização da TAP “são estabelecidas pelo Conselho de Ministros, mediante a aprovação de uma ou mais resoluções” – com pragmatismo, evita-se o recurso a decretos-lei,

-são definidas várias delegações de competências no “Ministro de Estado e das Finanças, com a faculdade de subdelegação no Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças” – é a expressão da prioridade à dimensão financeira e do ignorar das exigências da Economia,

-as acções transaccionadas no processo de privatização podem ser sujeitas a regime de indisponibilidade, por um prazo mínimo de 5 e máximo de 10 anos.

 

3.2.Caderno de Encargos: 19 de Outubro de 2012

*Respeito da Formalidade na Aprovação do Caderno de Encargos

A Publicação da Resolução do Conselho de Ministros a aprovar o Caderno de Encargos coincide com a da Resolução do Conselho de Ministros a admitir o potencial investidor que pode apresentar uma “Proposta vinculativa de aquisição e subscrição”. Esta coincidência

-devia ter sido evitada com a Publicação do Caderno de Encargos logo após a do Decreto-Lei,

-apesar de não ter consequências relevantes, formais ou substanciais, alimenta um incidente da luta partidária e a ideia de um processo de privatização nebuloso.

No debate na Assembleia da República, a 21 de Dezembro, o Primeiro-Ministro afirma que ”O caderno de encargos foi levantado por “diversos potenciais interessados””. É evidente que ou há equívoco com o Memoradum of Information, de Julho, ou o Primeiro-Ministro se refere a uma versão informal do Caderno de Encargos, antes da sua aprovação formal (20).

*Duas Disposições Tardias

É no Caderno de Encargos que encontramos duas manifestações tardias do Governo: a da criação da Comissão Especial e a da intervenção do Tribunal de Contas [ver Ponto 1 do presente post].

*Proposta Vinculativa de Aquisição e Subscrição

O Caderno de Encargos dispõe, entre outros, que a Proposta Vinculativa de Aquisição e de Subscrição de Acções é constituída, no mínimo, por “proposta financeira vinculativa”, “proposta técnica vinculativa”, “documentação” e “informação”. Na prática é: Projecto Estratégico, Modelo Financeiro, Documentos e Informação.

*Critérios a utilizar para a selecção

Citamos um destes critérios [ver ponto 10.3 do Documento de Trabalho], como exemplo do que consideramos ser uma redacção confusa e pelo papel que desempenha na decisão do Conselho de Ministros de 20 de Dezembro:

-m)A ausência ou minimização de condicionantes jurídicas ou económico-financeiras do investidor interessado, nomeadamente a minimização de conflitos de interesse entre as actividades do proponente e as do Grupo TAP, bem como a mitigação de riscos para a concretização da venda directa em prazo, condições de pagamento e demais termos que sejam considerados adequados para a salvaguarda dos interesses patrimoniais do Estado, bem como para a prossecução dos objectivos constantes da alínea d).” (21).

Um critério com esta redacção permite aprovar ou excluir uma proposta, com a maior das clarezas. Lembra-nos alguns artigos dos Regulamentos dos Planos Directores Municipais.

Quando enta parte do presente post é redigida, ignoramos que é, muito em especial, ao abrigo desta alínea que o Governo toma a decisão de 20 de Dezembro de 2012. Na ocorrência, um dos parágrafos do preâmbulo da Resolução do Conselho de Ministros de 28 de Dezembro, é de cristalina clareza, quando explicita o que é a inexistência de garantias [ver o ponto 3.3 do presente post]. Em oposição ao texto do Caderno de Encargos, o do preâmbulo da Resolução do Conselho de Ministro é claro, concreto e vai ao ponto.

*Propostas Vinculativas e a Substância do Negócio

Desconhecemos a Proposta Financeira Vinculativa do Grupo Synergy Aerospace. É público ter havido equívocos sobre o ponto crucial do Financiamento a Assegurar Pelo Accionista Privado [ver Ponto 1 do presente post].

Desconhecemos a Proposta Técnica Vinculativa do Grupo Synergy, mas é público que TAP, PARPUBLICA e Governo a consideram boa (22).

*Relatório, Parecer e Escolha do Proponente

Os passos a seguir são os seguintes (23):

-após a recepção das “propostas vinculativas de aquisição e de subscrição” e audição da TAP, S. A., quanto à adequação aos interesses da sociedade das propostas vinculativas de projectos estratégicos,” a PARPÚBLICA elabora, de modo fundamentado, um relatório que, entre outros “contenha uma apreciação de cada um dos proponentes e das respectivas propostas, determinando o seu mérito relativo em função dos critérios de selecção previstos [no Caderno de Encargos];

-o Relatório é enviado à Comissão Especial, “para emissão de competente parecer a respeito da regularidade, imparcialidade e transparência observadas no processo de venda directa.”;

-com base no relatório da PARPÚBLICA e do Parecer da Comissão Especial “o Conselho de Ministros procede à apreciação de cada um dos proponentes e das respectivas propostas vinculativas apresentadas para determinar o seu mérito relativo e selecciona a proposta ou propostas de aquisição e subscrição de acções objecto de venda directa.”.

 

3.3.Admissão do Potencial Investidor e Decisão do Conselho de Ministros

*Admissão do Potencial Investidor

Na Resolução do Conselho de Ministros de 19 de Outubro, o Governo decide que a Synergy Aerospace “seja admitido a participar no momento subsequente do processo de venda directa.”.

A 23 de Outubro o Governo decide que o prazo de apresentação da proposta vinculativa termina às 12 horas de 7 de Dezembro de 2012 (24).

A PARPÚBLICA é encarregue de convidar o potencial investidor “para proceder à apresentação de proposta vinculativa de aquisição e subscrição de parte ou da totalidade das acções objecto da venda directa, em conformidade e nos termos do disposto no Caderno de Encargos […] e que regula o processo e condições aplicáveis à realização da aludida venda directa.”.

*Respeito da Formalidade no Relatório da Comissão Especial

A Comissão Especial é constituída por Despacho de 11 de Dezembro, publicado a 17 do mesmo mês [ver o Ponto 6 do Documento de Trabalho]. Citamos o Dinheiro Vivo de 18 de Dezembro:

-“Já Amado da Silva [o seu Presidente] lembrou que nestas duas vendas [a da TAP e a da ANA] “temos de falar do interesse público", mas levantou a questão "de quanto tempo vamos precisar para avaliar?". A resposta surgiu célere e frisou mais uma vez o curto espaço de tempo: "Com certeza que não é numa semana nem num mês”, garantiu (25).

O Presidente Amado da Silva acerta:

-“não é numa semana nem num mês”, pois o parecer é dado em poucos dias.

Esta parte do processo está profundamente errada, porque a Comissão Especial não dispõe do tempo necessário para elaborar o Parecer.

Com efeito, esta Comissão

-“emitiu parecer sobre a regularidade, imparcialidade e transparência do processo, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do artigo 13.º do referido Caderno de Encargos, tendo a este respeito concluído pelo cumprimento das regras e procedimentos legais aplicáveis.” (26).

*Decisão do Conselho de Ministros de 20 de Dezembro de 2012

Com base nos Relatórios da PARPÚBLICA e da Comissão Especial, o Governo aprecia a proposta vinculativa do grupo Synergy Aerospace. O Governo entende, “desde logo”, que

-“a referida proposta não incluía elementos que permitissem ao Governo formar um juízo conclusivo quanto à existência de garantias de pagamento do preço devido pela alienação das acções, nem continha evidência da disponibilidade dos meios financeiros indispensáveis para promover a adequada recapitalização da TAP, SA, assim como para dotar a empresa dos recursos apropriados para fazer face às suas necessidades futuras de financiamento, designadamente assegurando a manutenção ou o refinanciamento da dívida actual da mesma.”.

O Governo determina a conclusão do processo de venda directa com a rejeição da proposta apresentada. A decisão é tomada com base nos Critérios de selecção (Artigo 5º do Caderno de Encargos), “em particular os constantes das alíneas m) e n)” [ver o Ponto 3.2 do presente post].

*Como é Possível?

A 19 de Outubro, o grupo Synergy Aerospace sabe que é o único a poder apresentar uma Proposta Vinculativa e a 23 sabe que tem de o fazer até 7 de Dezembro. Depois de 7 de Dezembro, há tempo para esclarecer dúvidas que a proposta suscite. É evidente que

-a Proposta Financeira Vinculativa tem de responder às exigências já referidas e que são públicas e notórias,

-ao não responder a estas exigências, os Assessores do Governo e/ou a PARPUBLICA teriam de esclarecer a questão, antes de se criarem expectativas sobre o desfecho da privatização e antes da reunião do Conselho de Ministros, a cuja reunião a Proposta não deveria sequer ser apresentada.

O que o Conselho de Ministros diz é que, depois de todo este processo, a Proposta Financeira Vinculativa não inclui as “garantias adequadas”.

Há qualquer coisa de errado e de não prestigiante em todo este processo.   

*Quando Uma Decisão Correcta é o Pior dos Desfechos

Pode uma decisão politica correcta ser o pior dos desfechos? Pode, quando

-não é a que a substância do problema exige, mas a que as circunstâncias impõem,

-resulta directamente de má preparação do dossier sobre o qual é tomada,

-tem consequências para a imagem do País e para a imagem e futuro da companhia,

-põe em evidência que o Plano B do Governo se reduz a deixar a TAP numa situação enfraquecida, à espera da abertura de um novo processo de privatização, que tenha sucesso.

 

A Bem da Nação

Albufeira 2 de Janeiro de 2012

Sérgio Palma Brito

 

Notas

(1) Declaração de Interesses: Defendemos, desde há muito, a privatização, se necessário, total da TAP. O texto que segue procura assentar em factos, mas não deixa de ser influenciado por esta posição.

(2)A nossa referência a TAP e a privatização é a da linguagem corrente – os aspectos jurídicos desta designação são detalhados no Ponto 2 do Documento de Trabalho. 

(3)A avaliação da Economia do Turismo é feita a partir da procura de Não Residentes (estrangeiros ou portugueses) e da transferência de recursos do exterior que gera. Esta é a definição da Comissão de Estatísticas da ONU, da União Europeia, FMI e Eurostat e implica que os emigrantes portugueses de visita a Portugal (mesmo alojando em Casa Própria ou a convite de Familiares e Amigos) são considerados turistas.

(4)De acordo com a Declaração de Interesses, antecipamos a necessidade de um novo accionista, posição que justificamos a seguir.

(5)Numa situação diferente da TAP, mas já vimos a marca Condor ser substituída por Thomas Cook e … o erro ser corrigido.

(6)Dinheiro Vivo de 3 de Outubro de 2012. Ver


Público de 21 de Dezembro de 2012. Ver


(7)É significativo que, em português, politica designe policie e politics e, na maior parte dos casos, esteja reduzida a este último significado.

(8)O conceito de Diáspora é mais adequado a realidade económica, social e cultural em cauda do que o de Comunidades Portuguesas ou Emigração.

(9)Dois esclarecimentos. Segundo o Relatório do Grupo TAP referente a 2011, entre 2001 e 2011, o contributo do hub para o aumento de passageiros no Aeroporto de Lisboa é de 57%. Os indicadores do INE não permitem quantificar esta afirmação, mas, no cado dos Não Residentes, não contabilizamos os residentes que regressam e os dos voos internos (muito importantes na TAP), nem os passageiros que apenas passam pelo hub de Lisboa para “desembarcar e embarcar”.

(10)Jornal de Negócios de 21 de Dezembro, Debate na Assembleia da Republica. Ver


(11)Jornal de Negócios de 21 de Dezembro de 2012. Ver


(12)A expressão “garantias adequadas” é utilizada insistentemente pela Secretária de Estado Maria Luís Albuquerque, na entrevista a Mário Crespo na SIC Noticias, no dia 20 de Dezembro, quando o Conselho de Ministros decide a conclusão do processo de privatização. A expressão reconhece que há vários tipos de garantias a prestar e não apenas Grantias Bancárias.

(13)“Li hoje num jornal diário que a meio do Conselho de Ministros ainda tentámos que o concorrente pagasse. O delírio neste processo tem sido imenso mas não é suscitado por iniciativa do Governo. Esses episódios não existiram nunca durante o processo de privatização” – Jornal de Negócios de 21 de Dezembro.


(14)Dinheiro Vivo de 3 de Agosto de 2012. Ver


(15)Jornal de Notícias de 19 de Outubro de 2012. Ver


 (16)Expresso online de 18 de Dezembro de 2012. Ver


(17)Resolução do Conselho de Ministros nº 111-B/2012, de 28 de Dezembro. Ver


(18)Publico de 11 de Dezembro de 2011. Ver


(19)O que designamos por Decreto-Lei de Agosto/Setembro de 2012 e a envolvente pertinente são descritos em detalhe no ponto 9 do Documento de Trabalho. Sobre o formalismo legal ver o Ponto 2 do Documento de Trabalho.

(20)Jornal de Negócios de 21 de Dezembro de 2012. Ver


(21)A alínea em causa é: d) A salvaguarda dos interesses patrimoniais do Estado, nomeadamente no que respeita ao encaixe financeiro decorrente da venda directa.

(22)Ver várias declarações da Secretária de Estado Maria Luís Albuquerque e do Primeiro Ministro, este durante o debate na Assembleia da Republica, a 21 de Dezembro.

(23)Descrevemos o modelo teórico, que figura no Caderno de Encargos. Como há uma só Proposta vinculativas de aquisição e de subscrição, o que está em causa é TAP, PARPUBLICA e Comissão Especial validarem essa Proposta.

(24)Despacho nº 13719-A/2012, citado pelo Jornal de Negócios de 24 de Outubro (edição papel).

(25)Dinheiro Vivo de 18 de Dezembro. Ver


(26)Preâmbulo da Resolução do Conselho de Ministros n.º 111-B/2012, de 28 de Dezembro, referente à Reunião do Conselho de Ministros, que tem lugar a 20 do mesmo mês.

 

2 comentários:

  1. Descobri o seu blog recentemente, e muito me surpreendeu, pela positiva. Numa altura em que não há vontade de fazer informação séria, como aliás se percebe pelas referências que faz da imprensa e dos governantes, o seu blog consegue ter uma aproximação estruturada, documentada e baseada em factos.

    Quanto à temática da TAP, eu enquanto funcionário da mesma, partilho de muitas das suas preocupações e dúvidas. Não me parece que toda esta operação tenha sido séria e cuidada, o que me leva a preocupar com o futuro.

    A TAP e o hub de Lisboa tem características operacionais únicas:

    - Lisboa é o único hub que consegue ligar todo o Golfo da Guiné e África Ocidental à Europa utilizando aviões narrowbody (A320F e B737F), sem restrições de performance, e durante o período do curfew (período nocturno);

    - A TAP, a partir de Lisboa, é a única companhia (das legacy carriers) que consegue operar para o Atlântico Sul e Norte apenas com dois Pilotos;

    - A TAP, a partir de Lisboa, consegue operar para o Leste Europeu (desde Helsinquia e S. Petersburgo até Istanbul e Tel Aviv) em narrowbody (A320F), saindo ao fecho do aeroporto (cerca das 2200-2300), chegando à hora de abertura desses aeroportos, e regressando a Lisboa de manhã. Desta forma, aproveita o período do curfew na Europa, com os seus aviões no ar, com taxas de utilização bastante elevadas, em contraponto com os concorrentes. Novamente, é a única na Europa a poder fazer esta operação;

    Estas condições operacionais são únicas e exclusivas dos aeroportos nacionais (em particular de Lisboa) devido à posição e distância geográfica, bem como diferença horária e longitudinal;

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  2. Lamento a indesculpável demora em responder ao seu comentário, positivo ainda por cima. Agradeço a informação, sobre a qual tinha uma ideia. Algures no que escrevi sobre a TAP, sublinhei a importância da TAP (ou INSC)divulgar as Vantagens Comparativas do hub de Lisboa - é o que o Pedro Tito que faz e numa linguagem que toda a gente entende. As Vantagens Comparativas não são eternas (Lisboa já as teve e perdeu-as) mas são um argumento muito forte para acrescentar às Vantagens Competitivas.

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