Reestruturação da TAP pelo accionista Estado


O presente post foi concebido bem antes de serem conhecidas as empresas que apresentam propostas vinculativas para comprar a TAP. A estrutura da série de posts faz com que seja finalizado depois de conhecermos as três candidaturas, que clarificam o confronto decisivo entre

-governo, que pode escolher entre dois bons candidatos e tem o dever democrático de decidir a privatização,

-e PS, que sai enfraquecido pela escolha entre dois candidatos possíveis e que tem o direito democrático de fazer o País o pagar para inverter a decisão, mas ao qual não atribuo o dever e o fazer.

Neste contexto, o presente post pode apenas servir para avaliarmos a atitude do governo em excluir e a do PS em querer impor a capitalização e reestruturação pública da TAP.

O post descreve

-o ‘accionista estado português político partidário’ que passa a ser responsável pela reestruturação da TAP e pela nova,

-como a União Europeia condiciona/impõe esta reestruturação com duas vias de saída: o sucesso da reestruturação ou a falência da TAP.

Convidamos o leitor a um pequeno exercício:

-imaginar um plano de reestruturação (1) como o descrito no post anterior (aqui), mas em vez de decidido e implementado por accionista e gestão conhecedores do negócio, passa a ser acordado entre o ‘accionista estado português político partidário’ e técnicos superiores da União Europeia.

 

Informação ao leitor

O presente post tem versão em PDF está disponível (xxxx).

O leitor deve estar informado sobre os Princípios Gerais do blogue.

A lista dos posts sobre a TAP está acessível aqui.

 

1.Portugal: ’Estado’ e ‘accionista estado’ na privatização da TAP

1.1.Introdução

*É uma realidade portuguesa com certeza

A nossa análise da decisão de privatizar ou não a TAP assenta na realidade concreta

-do ‘Estado português da aviação civil’ corporizado pelo ‘sistema político e administrativo da aviação civil’,

-do ‘accionista estado português político partidário’ da TAP, que integra o que resta deste sistema,

-da sobreposição do calendário político do País com o da privatização da TAP e o ‘Estado português’ a liderar o processo que descrevemos no ponto 2 do presente post.

Esta realidade bem portuguesa no pior sentido da palavra

-sobrepõe-se à dimensão ideológica que influencia a posição de governo e PS,

-inviabiliza muitas das comparações com os estados e companhias aéreas de outros países. 

*‘Estado português’ e ‘sistema político/administrativo’ da aviação civil em Portugal

O ‘Estado português da aviação civil’ é corporizado pelo ‘sistema político e administrativo da aviação civil em Portugal’. Ao longo dos anos identificámos este sistema, formado por pessoas e instituições, ligadas por relações que se consolidam ao longo de décadas.

São pessoas do ‘arco do poder politico’, fazem o seu melhor com as excepções que confirmam a regra, alternam cargos nas empresas públicas e administração, com saltos pelo governo e são guardiãs do poder e do saber. Conhecemos muitos, lidámos com quase todos ao ponto de criar amizade com alguns.

Não dispomos de meios para o analisar, mas é este sistema que, em nome do ‘Estado português da aviação civil’ e do interesse público,

-define políticas para a aviação civil, é proprietário de instalações e de empresas, seu utilizador, administração pública, regulamentador e fiscalizador, accionista, fiscal e gestor, concorrente de si próprio (na Grounforce e Portway), regulador e regulado (2).

Insistimos sobre o ‘accionista estado português político partidário’ da TAP ser parte do que resta deste sistema.

*Intervenção futura do Estado na aviação Civil

Durante anos e até à actualidade, a força e homeostasia deste sistema ilude a dramática fraqueza do Estado português no exercício das funções de um estado moderno. Portugal acumula atraso em dispor do Estado ‘sem comas’, que intervenha no que o sector privado não pode assegurar:

-regulação económica de todo o sistema da aviação civil, com destaque para a regulação económica da gestão aeroportuária (3),

-centro de conhecimento público, que terá de resultar da colaboração entre administração e universidade,

-policy cujas grandes linhas sejam conhecidas e partilhadas pelos partidos da responsabilidade de governar Portugal e pelas partes interessadas pertinentes.

 

1.2.Quarenta anos de ‘accionista estado português político partidário’

*Quarenta anos

A intervenção do ‘accionista estado português político partidário’ ao longo dos quarentas anos que vão da nacionalização à prevista privatização é marcada por tempos diferentes:

-entre 1975/1994, paga e alimenta a narrativa da ‘transportadora aérea nacional”,

-depois de 1994, ignora a nova realidade da TAP obrigada a ser rentável em mercado aberto e sem ajuda do estado,

-entre 1975/2015, bloqueia a capacidade da TAP se adaptar às exigências do mercado,

-entre 1975/2000 nomeia gestores de génese politico partidária e desconhecedores do negócio e a gestão profissional é imposta por factores externos,

-desde 1994 e apesar de sucessivas decisões de o fazer não consegue privatizar a TAP,

-entre 2009 e a actualidade, permite a descapitalização da empresa ao ponto de comprometer a sua viabilidade.

Na actualidade e com a TAP a ir bater contra a parede, o confronto entre PS e governo também é o confronto entre o que resta do ‘sistema político e administrativo da aviação civil e forças/pessoas de governo que o enfrenta.

Em Portugal, este é o ‘accionista estado’ e é diferente do accionista estado de países comparáveis.

*A empresa comunidade de accionista, gestão e trabalhadores

O ‘accionista estado português político partidário’ destrói a dinâmica virtuosa que viabiliza a empresa como comunidade de accionista, gestão e trabalhadores:

-desde sempre, por pagar ou dar a ilusão que pode pagar os prejuízos da empresa e nunca exigir a remuneração do capital,

-entre 1975/2000 pela nomeação de gestores de génese político partidária e desconhecedores do negócio,

-desde 2001, pela relação de irresponsabilidade com a gestão, sem formalização de objectivos e dispensa da remuneração do capital,

-desde 1975, pela relação viciosa de “condomínio estre o Estado e os sindicatos, que exercem um eficaz poder de veto na gestão da empresa”, nas palavras de Vital Moreira (aqui).

Esta é a origem do ‘accionista estado’ bloquear a possibilidade da empresa se adaptar às exigências reais do mercado.

*Serviços estratégicos e empresas que os asseguram

Apesar das divisões da ideologia, cultura e das influências das máquinas partidárias, o ‘accionista estado português político partidário’ corporizado por governo e Partido Socialista é concorda na incapacidade de explicitar o essencial:

-a definição de uma politica, no sentido de policy, que dê prioridade à acessibilidade aérea competitiva que apoie o desenvolvimento económico, social e cultural de Portugal, na qual a TAP e a sua privatização se integram mas à qual não se sobrepõem.

Luís Campos e Cunha diz isto por outras palavras:

-"A TAP faz serviços estratégicos para o país, o que é diferente de ser uma empresa estratégica. São alguns serviços e não a empresa em si" (aqui).

*Instabilidade de posições e de pessoas

Na ausência da policy da responsabilidade do ‘Estado português’, o ‘accionista estado português político partidário’ é caracterizado pela instabilidade

-de estratégias empresariais saídas de cada equipa de gestão que nomeia durante o quarto de século que vai da nacionalização à gestão profissional,

-de posições políticas conjunturais, de que são exemplo: i)o PSD violentamente contra a privatização da ANA em bloco e depois a privatizar a ANA … em bloco; ii)o PS que entre 1995/2011 deixa a ANA gerir os aeroportos sem contrato de concessão e depois critica o governo pelo contrato de 2012 (4),

-das pessoas que o representam sem preparação prévia e tão diferentes como Paulo Campos (com Mário Lino e António Mendonça) e Sérgio Monteiro (com Santos Pereira e Pires de Lima) – segundo o Expresso, desde 2001 a gestão profissional da TAP já conheceu cinco primeiros-ministros e nove ministros dos Transportes (5). 

 

1.3.‘accionista estado português político partidário’ na actualidade

*Governo e Partido Socialista – a substância da divergência

Entre governo e Partido Socialista há uma divergência substantiva. A nível do Primeiro-Ministro e da ministra das Finanças, o governo está consciente da TAP precisar de reestruturação sem a qual definha a caminho da insolvência desordenada (aqui). Talvez mais do que a ideologia, o que  os leva a defender a privatização da TAP é esta realidade e o saberem que o ‘accionista estado’, por incapacidade congénita e condicionamento da União Europeia, não consegue implementar a reestruturação de que a empresa carece.

Para o PS

-"a TAP não é uma companhia qualquer, é uma companhia que garante hoje a soberania nacional e o risco de perdermos a TAP é um risco enorme para o futuro do país" (aqui).

-"A TAP não está tecnicamente falida, tem vindo a ter um trajecto muito positivo ao longo dos últimos anos, tem um problema muito localizado na sua empresa de manutenção do Brasil, e teve um problema muito sério no Verão do ano passado" (aqui),

-"mesmo que não houvesse recursos do Estado para fazer essa capitalização [a pública], a solução devia ter sido aumentar o capital da empresa por via da sua dispersão em bolsa e nunca, em circunstância alguma, perdendo o Estado a posição maioritária no capital da empresa". (aqui).

Receamos que, uma vez no governo, o PS seja surpreendido pela realidade da TAP, pelo que representa a União Europeia a condicionar a reestruturação pública e pelas exigências de uma oferta pública de acções em bolsa.

*Governo e oposição – iliteracia na política da União Europeia?

Como veremos no ponto 2, a capitalização pública da TAP configura auxílio do Estado, a aprovar pela Comissão de acordo com a política da União Europeia sobre auxílio do estado a empresas. Esta política tem dezenas de anos e no caso de companhias aéreas está formalizada em vários documentos e divulgada em folheto de Julho de 2014.

Não acreditamos que governo e PS não tenham informação sobre as exigências e implicações no caso da capitalização pública da TAP. Mais concretamente

-o argumento da capitalização pública ser impossível nunca deveria ter sido usado, para além de declarações irresponsáveis de governantes, figura no preâmbulo do decreto-lei de Dezembro de 2014 que formaliza o processo de privatização da TAP,

-a possibilidade da TAP ser obrigada a ‘encolher’ actividades e pessoal devia ter sido claramente explicada pelo governo e assumida pelo PS e todos os que se opõem à privatização da TAP,

-esta última omissão pode ser entendida como manobra para iludir os cidadãos por PS e todos os que se opõem à privatização da TAP, o que é muito grave.

A inaceitável iliteracia, real ou aparente, de governo e Partido Socialista sobre política de concorrência da União Europeia ainda se manifesta hoje. Consegue apenas ser pouco mais qualificada do que a do tempo em que políticos e comentadores se guerreavam com base em declarações vagas de Comissária europeia de visita a Lisboa (6).

*Obrigações de serviço público segundo o governo

No Anexo 2 mostramos como as Obrigações de Serviço Público a assegurar por uma companhia aérea

-têm definição formal a nível da União Europeia e da legislação nacional,

-no caso da Região Autónoma da Madeira são suprimidas em 2008 e recentemente são reduzidas ao mínimo no caso da Região Autónoma dos Açores.

De entre várias, damos exemplo de declarações do Ministro da Economia que

-mostram como o governo não tem noção da realidade das OSPs, mas faz afirmações sobre a sua natureza e extensão que iludem as pessoas sobre o que a privatização da TAP ‘garante’ – ver detalhe no post Privatização da TAP – realidade e ilusão de ‘garantir serviço público’ (aqui).

Mostramos finamente como governantes, decreto-lei sobre formalização da privatização da TAP e Caderno de Encargos se embrulham na definição das OSPs.

A realidade é simples e não tem nada a ver com ideologia. O governo que assume o papel de Estado e ‘accionista estado’

-não tem ideias claras sobre pontos importantes da definição das condições de privatização da TAP,

-deixa a defesa do interesse público nas mãos do profissionalismo de futuros adquirentes da TAP.

*Privatização mal preparada e impossível consenso

No início de Maio, o leader do PS critica a privatização mal preparada:
-“foi muita negativa a decisão de a privatização se fazer no final da legislatura e sem que haja um consenso politico alargado como era absolutamente imprescindível que houvesse para uma decisão desta dimensão estratégica" (
aqui).

Pela mesma ocasião, passa da crítica ao confronto:

-“o processo em curso nunca conduza a uma alienação de mais de 49% do capital e um governo do PS tudo fará para que seja revertida qualquer situação que entretanto seja tomada que ponha em causa a manutenção da maioria do capital por parte do Estado”. (aqui).

-“O próximo Governo do PS tudo fará que esteja ao seu alcance e que ainda seja possível fazer para assegurar que a TAP não tenha a maioria do capital privatizado”, garantiu, considerando que a TAP “é a empresa estratégica fundamental para garantir a soberania nacional” (aqui).

 

2.Reestruturação da TAP pelo accionista estado e condicionamento pela União Europeia

As orientações da UE sobre “auxílios estatais ajuda de emergência e à reestruturação a empresas em dificuldades” têm como objectivo, entre outros, obter a viabilidade futura da empresa em mercado aberto e sem apoio público.

Este objectivo das orientações da União europeia

-não difere do exigido à reestruturação por accionista privado,

-difere e muito por ser atingido por reestruturação implementada pelo ‘accionista estado português político partidário’ e não por accionista privado comprometido com o sucesso da empresa, como descrevemos no post anterior.

O texto que segue apenas refere a TAP.

 

2.1.Ajuda pública e reestruturação de companhias aéreas

O auxílio do Estado à TAP deve conduzir a verdadeira reestruturação da empresa e contribuir para que a Europa disponha de indústria formada por companhias aéreas fortes e saudáveis.

Para realizar estes fins, o auxílio do Estado à TAP é condicionado pela União Europeia em quatro pontos:

-plano de reestruturação da TAP,

-contribuição própria da TAP em 50% do custo da reestruturação,

-medidas destinadas a limitar as distorções da concorrência

-ser monitorizado.

Se a Comissão entender que este processo não viabiliza a TAP, a alternativa é simples e brutal:

-falência da TAP e prioridade politica a que outras companhias aéreas assegurem a conectividade dos aeroportos (7).

 

*Plano de reestruturação para a viabilidade da empresa

Os elementos mais importantes do plano de reestruturação da TAP são:

i)’Facilitar as operações para a empresa se focar na actividade chave de transporte de passageiros’, o que entre outros

-obriga quase certamente à alienação da Manutenção do Brasil com custo que desconhecemos mas que implica aumentar o auxílio do Estado e a participação da TAP,

-pode questionar a Manutenção de Lisboa e obrigar a privatizar actividades marginais, como a empresa das lojas francas;

ii)’Melhorar a base de custos’ pode implicar

-racionalizar a frota, o que pode implicar a sua redução,

-minimizar custos de pessoal, o que pode implicar uma combinação de despedimentos (por mútuo acordo ou não), redução de salários e alteação profunda do Acordo de Empresa.

iii)”Last but not the least”, ‘redefinir a rede de ligações’

-obriga a TAP a focar-se em sinergias que venham da localização geográfica (caso do hub de Lisboa) e sobretudo nas rotas mais rentáveis.

*Contribuição própria da TAP

A União Europeia

-impõe “uma contribuição significativa para os custos de reestruturação a partir dos recursos próprios do beneficiário do auxílio, dos seus accionistas ou credores ou do grupo empresarial de que faz parte, ou a partir de novos investidores.”,

-e considerar-se-á que a contribuição própria é adequada se o seu montante se elevar a, pelo menos, 50 % dos custos de reestruturação”.

*Medidas destinadas a limitar as distorções da concorrência

A Comissão “irá apreciar a forma e o âmbito adequados” das medidas destinadas a limitar as distorções da concorrência. Estas medidas passam por reduzir actividades lucrativas da empresa – não é erro, a redução de actividades deficitárias não conta.

Mais concretamente e entre outros, estão em causa

-redução de capacidade, medida em Available Seat Kilometers (ASK),

-venda de slots em aeroportos congestionados (8).

(8)Ver post ‘Portela 2012 – Imparcialidade, Transparência e Não Descriminação na Atribuição de Slots’ (aqui).

Sobre este elemento da viabilização da TAP, a Comissão consulta o mercado em que o auxilio à TAP pode prejudicar outras empresas. Sem paranóia, não espantaria ver full services carriers contestar a aquisição dos A350 que concorrem com as ligações do hub de Lisboa ou o número de slots em Heathrow, S. Paulo ou outros.

Ver o Anexo 3 sobre como este princípio foi avaliado em 1994. Em 2015/16, devemos esperar mais rigor.

*One time last time e monitorização

As linhas de orientação da UE são claras sobre:

i)“One time, last time principle”: uma companhia não pode ser ajudada se o foi durante os últimos dez anos, de modo a desperdiçar dinheiros públicos em companhias inviáveis. Como a TAP já foi ajudada em 1994, pode ser mas não nos deve espantar que haja um maior rigor.

ii)Monitoring implementation

A Comissão acompanha o processo de reestruturação com base em relatórios enviados pelos estados membros. Mais uma vez, a monitorização deverá ser mais severa do que em 1994/1997.

*Intervenção da Comissão

Há precedentes de decisões da Comissão sobre auxílio do estado à reestruturação de companhias aéreas:

-antes da crise de 2008/2009, temos Alitalia em 2005, Cyprus Airways em 2007, Olympic Airways em 2008 e Austrian Airlines em 2009,

-desde 2010 há notificações de ajuda do Estado à reestruturação de Czech Airlines, Air Malta, LOT Polish Airlines, airBaltic, Adria Airways, Cyprus Airways and Estonian Air,

-três casos em curso: Cyprus Airways, Estonian Air e LOT Polish Airlines (9).

É oportuno sublinhar

-a existência de uma experiência que os responsáveis políticos não podem ignorar e que ajuda a situar o caso da TAP,

-as decisões recentes sobre a LOT e Cyprus Airways são muito pertimemtes e devem ser estudadas – os mais apressados podem limitar-se ao comunicado de imprensa da Comissão (10).

 

2.2.E se a ajuda pública não funcionar? Falência da TAP!

*Falências e primado da conectividade dos aeroportos

A avaliação que a Comissão faz da companhia aérea em dificuldade inclui a sua falência se não for viável e depender de ajuda dos contribuintes, minado a concorrência no mercado único.

*Recuperação da ajuda pública, falência e conectividade

O folheto da Comissão lista três situações possíveis:

-falência e liquidação

-criação de uma nova companhia e o caso da Alitalia em 2008

-conectividade pela obrigação de serviços públicos.

Nesta fase do processo TAP, mais do que as situações possíveis, interessa a postura da Comissão:

-a falência da TAP é apenas o que acontece se Portugal não for capaz de justificar o auxílio do estado para capitalizar a empresa,

-o que conta é outras companhias viáveis sem ajuda publica assegurarem a conectividade dos aeroportos do País.

 

A Bem da Nação

Lisboa 16 de Maio de 2015

Sérgio Palma Brito

 

Anexo 1 – Notas sobre a União Europeia e o auxílio do estado à TAP

A inaceitável iliteracia, real ou aparente, de governo e Partido Socialista sobre política de concorrência da União Europeia ainda se manifesta hoje, mas já não é o que foi quando políticos e comentadores se guerreavam com base em declarações vagas de Comissária europeia de visita a Lisboa (11).

As declarações do ministro da Economia a 5 de Dezembro de 2014 datam deste período:

-“Um Estado não pode injectar capital nas empresas [de aviação], salvo uma circunstância excepcional: só em razão de um plano de salvamento. E só se pode fazer uma vez e a TAP já o fez” (12). (aqui).

A 17, o secretário de estado dos Transportes contradiz o ministro da Economia e transforma a “impossibilidade” do ministro em opção politica:

-refere que a União Europeia impõe que a capitalização pública implique, entre outros, “diminuição de rotas e despedimento de pessoas” e reconhece ser a defesa do serviço da TAP por inteiro que “nos impede de olhar para esta hipótese” e por isso “acreditamos que é impossível injectar dinheiro na TAP” (aqui).

A primeira grande crítica do PS ao Governo

-é ser "incompreensível que não se tenham esgotado todos os esforços junto da Comissão Europeia para que se procedesse à capitalização pública da TAP", porque, "ao contrário do que foi dito muitas vezes, não é verdade que a União Europeia não permita a capitalização pública" (aqui).

A crítica é repetida, mas nunca o PS se pronuncia sobre

-a capitalização pública implicar programa de reestruturação condicionado pela União Europeia, que pode reduzir a TAP à dimensão de Tapezinha que o PS critica na política do governo (aqui) e poder ser o governo PS a implementar o programa e criar a Tapezinha.

 

Anexo 2 – Notas sobre Obrigações de Serviço Público

2.1.Definição formal e realidade das Obrigações de Serviço Publico

*Definição Formal de Obrigações de Serviço Público

As Obrigações de Serviço Público têm definição formal pela União Europeia e legislação nacional - ver site da ANAC (aqui). Sugerimos consulta do post ‘Privatização da TAP – realidade e ilusão de garantir serviço público’ (aqui).

Na actualidade, as OSPs são marginais.

*Região Autónoma da Madeira

No caso das ligações entre o Continente e a Região Autónoma da Madeira, é o governo de maioria absoluta do PS que em 2008,

-considera que “a liberalização do mercado do transporte aéreo para a Região Autónoma da Madeira pode trazer benefícios ao nível das tarifas a praticar, tendo em conta a actuação das regras da concorrência num mercado aberto a todos os operadores” 

-entende “pôr termo à imposição de obrigações de serviço público para a Região Autónoma da Madeira, designadamente em matéria de fixação de tarifas”,

-aguarda que “as regras de funcionamento de mercado permitam, a curto prazo, uma redução dos preços praticados para aquela Região e consequentemente um aumento do número de passageiros, com um incremento significativo ao nível do turismo.” (13).

*Região Autónoma dos Açores

No caso das ligações entre o Continente e a Região Autónoma dos Açores, em Janeiro de 2015 o governo decidiu

-“suprimir as obrigações modificadas de serviço público para as ligações aéreas Lisboa/Ponta Delgada/Lisboa, Lisboa/Terceira/Lisboa, Porto/Ponta Delgada/Porto e Porto/Terceira/Porto”,

-impor obrigações modificadas de serviço público para os serviços aéreos regulares nas rotas Lisboa/Horta/Lisboa, Lisboa/Santa Maria/Lisboa, Lisboa/Pico/Lisboa e Funchal/ Ponta Delgada/Funchal.

 

2.2.Amostra de declarações do ministro da Economia

As intervenções do ministro da Economia justificam post específico, mas destacamos a sua versão das “obrigações de serviço público”, divulgada em meados de Novembro de 2014 e já objecto de crítica no post “Privatização da TAP – realidade e ilusão de ‘garantir serviço público’” (aqui):

-"Em qualquer caso serão sempre garantidas obrigações de serviço público. Voos para a Guiné? Claro que o futuro accionista da TAP tem que garantir. Voos para os Açores e para a Madeira? Claro que o futuro accionista da TAP tem que garantir. Voos para as comunidades lusófonas? Faz parte do caderno de encargos", disse Pires de Lima aos jornalistas à margem da III Conferência Franco Portuguesa, em Lisboa.

"São condições que nós protegeremos de uma forma reforçada enquanto tivermos 34% do capital e que protegeremos de outra forma se deixarmos de estar no capital, se isso eventualmente vier a acontecer", disse.

Segundo o governante, assegurar as obrigações de serviço público da companhia, "tem que ser sempre uma garantia e até uma condição para que a TAP possa ser privatizada a 100% algum dia" (aqui).

Sobre o caso da rota Lisboa Bissau recomendamos ainda Privatização da TAP – “o accionista privado tem de garantir a ligação com a Guiné-Bissau” (aqui) e sobre a rota Heathrow-Funchal ver Privatização da TAP – quando a realidade do mercado contraria o equívoco politico (aqui).

 

2.3.Decreto-Lei n.º 181-A/2014 de 24 de Dezembro

Segundo o i:

"A TAP é uma companhia de bandeira por estatuto, porque ela presta um serviço público na ligação às ilhas e um serviço fundamental na ligação à diáspora portuguesa", acrescentou o secretário de Estado ainda a propósito da venda da TAP. As obrigações actualmente impostas à companhia "serão mantidas independentemente de quem for o accionista futuro da TAP, (aqui).

Não compreendemos a referência a “companhia de bandeira”, uma noção indefinida e hoje obsoleta na aviação civil – não no transporte marítimo, por exemplo. Certo é que a voltamos a encontrar no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 181-A/2014 de 24 de Dezembro que formaliza o processo de privatização da TAP. Citamos parte do preâmbulo, sem referência a OSP mas sim à indefinida noção de «companhia bandeira»:

-“Está em causa uma empresa que apresenta forte ligação ao país, ligação essa que importa manter, afigurando –se por isso relevante privilegiar a manutenção do seu pendor característico enquanto «companhia bandeira». O Governo considera que o processo de reprivatização da TAP deverá respeitar a importância estratégica do chamado «hub nacional», como elo fundamental nas relações entre a Europa, a África e a América Latina, de que as operações aéreas da TAP são um elemento primordial, tendo igualmente presente a importância das ligações dentro do território nacional, em particular aquelas que asseguram a conexão entre o território continental e ilhas, as quais se mostram fundamentais para promover a coesão territorial e social e o desenvolvimento económico.”.

No articulado, o número 3 do Artigo 4.º (Processo da venda directa de referência) dispõe:

-“3-Constituem critérios de selecção das intenções de aquisição para integração dos potenciais investidores em subsequentes etapas do processo de venda directa e para a escolha das propostas objecto de adjudicação:

d) A capacidade para assegurar o cumprimento, de forma pontual e adequada, das obrigações de serviço público que incumbam à TAP;” [o sublinhado é nosso]. 

O secretário de estado dos Transportes destaca esta explicitação das OSP:

A terminar, sublinha:

-“A expressão serviço público não constava do diploma de 2012, revogado com a entrada em vigor deste novo Decreto-Lei.” (aqui).

2.4.Caderno Encargos: RCM nº 4-A/2015, de 20 de Janeiro

O Artigo 5º da Resolução do Conselho de Ministros 4-A/2015, de 20 de Janeiro (aqui) define os critérios de selecção do adquirente da TAP. De entre estes, citamos:

-“d)A capacidade para assegurar o cumprimento, de forma pontual e adequada, das obrigações de serviço público que incumbam à TAP, S. A., incluindo no que concerne às ligações aéreas entre os principais aeroportos nacionais e das regiões autónomas, quando aplicável, bem como a continuidade e reforço das rotas que sirvam as regiões autónomas, a diáspora e os países e comunidades de expressão ou língua oficial portuguesa;”.

O texto do Caderno de Encargos alarga alegremente a abrangência das Obrigações de Serviço Público.

A exigência de “reforço das rotas que sirvam as regiões autónomas” é paradoxal por ser feita quando a TAP publica reduz.

 

Anexo 3 – 1994: “potenciais efeitos negativos do auxílio na concorrência”,

Em 1994 a Comissão avalia para os anos 1994/1997 os “potenciais efeitos negativos do auxílio nas trocas comerciais e na concorrência”. É uma avaliação focada nas ligações intra europeias pela sua importância e porque o reduzido tráfego de longo curso não ser concorrente significativo, ao ponto da TAP ser autorizada a adquirir os quatro A340 de que ainda dispõe.. Em síntese, a TAP

-não utiliza o auxílio para expansão da actividade e dumping, não cria nova rota europeia e tem como “único objectivo o de racionalizar a sua rede” e reduz a frota de 38 aviões em 1993 para 32 em 1997,

-a oferta de lugares no mercado europeu diminui 9,5%, num período em que a procura cresce a 6,6% ao ano.

Citamos,

-“ Em geral, a TAP tem uma parte de cerca de 3 % do número total de passageiros europeus transportados pelas transportadoras aéreas membros da AEA (Associação das Transportadoras Aéreas Europeias). Com uma parte de mercado tão pequena, e tendo em consideração que a TAP planeia deixar de operar em várias rotas europeias, que prevê um aumento de capacidade inferior ao valor médio previsto pela IATA durante o período de reestruturação e ainda que não tenciona passar a operar em novas rotas no mercado europeu, é virtualmente impossível sustentar que a recuperação da TAP vai afectar a competitividade das suas concorrentes europeias.”.

 

Notas

(1)No início de maio de 2015, numa carta enviada aos trabalhadores da TAP durante a greve do SPAC, Fernando Pinto menciona "a necessária restruturação da empresa”. A ‘restruturação’ a que nos referimos é diferente, muito mais profunda e implementada ou pelo accionista privado depois da privatização, ou pelo accionista estado no âmbito da recapitalização pública da TAP.

(2)Ver post publicado em 2 de Agosto de 2011: Sobre a racionalidade, utilidade e modalidade da privatização da ANA – Aeroportos e Navegação Aérea SA (aqui).

(3)Na ausência de post específico sobre esta regulação, o leitor mais interessado pode percorrer posts sobre privatização da ANA e gestão de slots em aeroportos congestionados (aqui).

(4)Ver o detalhe no post Privatização da ANA (2): Quinze Anos de Privatização e Dois Para Vender (aqui).

(5)Revista E do Expresso de 28 de Fevereiro de 2015.

(6)Sobre as declarações da comissária, ver o Anexo 1 e Nota (11). O que designamos por orientações da União Europeia sobre o auxílio do estado à TAP está formalizado em regras compatíveis com o Mercado Interno e que constam dos seguintes documentos:

-Comunicação da Comissão, Orientações comunitárias relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação a empresas em dificuldades (2004/C 244/02) (aqui).

-“State aid for airline restructuring: does it give you wings?” de 9 de Julho de 2014 (aqui).

-Comunicação da Comissão, Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas não financeiras em dificuldade (2014/C 249/01) (aqui).

-Competition policy brief, “State aid for airline restructuring: does it give you wings?” de 9 de Julho de 2014 (aqui).

Sobre o precedente de 1994, ver

-Decisão da Comissão, de 6 de Julho de 1994, relativa ao aumento de capital, garantias de crédito e isenção fiscal existente em favor da TAP (aqui).

(7)Ver ponto 2.1 e post sobre Introdução à conectividade dos aeroportos de Portugal (aqui).

(8)Ver post ‘Portela 2012 – Imparcialidade, Transparência e Não Descriminação na Atribuição de Slots’ (aqui).

(9)Aconselhamos a leitura do folheto já refrido na Nota (6): Competition policy brief, “State aid for airline restructuring: does it give you wings?” de 9 de Julho de 2014 (aqui).

(10)Ver comunicados de imprensa da decisão da Comissão sobre a Cyprus Airways em 1 de Janeiro de 2015 (aqui) e LOT em 29 de Julho de 2014 (aqui), a partir dos quais se faz download to texto completo.

(11)A politica da União Europeia sobre auxilio do estado a empresas e, em particular a companhias aéreas, tem dezenas de anos, está formalizada em vários documentos e divulgada em folheto. Sobre a Comissária e entre outros, ver o Expresso: ““Bruxelas diz que injetar dinheiros públicos em companhias aéreas é "questão delicada”” (aqui).

(12)Segundo o jornal, o ministro ‘disponibilizou-se para entregar aos deputados uma cópia do documento que a Comissão Europeia publicou em Julho sobre as ajudas de Estado ao sector da aviação’, documento que desmente a sua afirmação.

(13)Sobre Madeira e Açores, ver Decreto-Lei n.º 66/2008, de 9 de Abril (aqui) e Portaria n.º 316-A/2008 de 23 de Abril (aqui) e Decreto-Lei n.º 41/2015 de 24 de Março (aqui).

 

 

 

 

 

 

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